quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Dioces de LamegoDIOCESE DE LAMEGO VAI CONVERSAR

DIOCESE DE LAMEGO VAI CONVERSAR
COM O PADRE DEFENSOR DO «SIM»

Exmº Senhor Director de “DIÀRIO DE VISEU”

Na edição do dia 9 do corrente, na pág. 5, publica V. Excª uma nota extensa acerca da minha posição em relação ao meu voto «sim» no referendo do passado dia 11 do corrente. Nesse texto louvo o esforço de precisão, sinto a necessidade de contenção, resultando, ao fim e ao cabo, ambiguidades e omissões que acabam por deixar dúvidas acerca da minha dignidade e responsabilidade de homem cristão e padre, o que, acredito, V. Excª não pretendeu comprometer. Por isso, venho pedir-lhe o favor de publicar este esclarecimento.
Permita-me que sublinhe, claramente, as razões substantivas da minha decisão.
Primeiro: entendi que um dos aspectos da proposta conduzia a uma realidade concreta: o perdão legal da mulher pecadora, e isto configura, para todos os cristãos a doutrina e a praxis evangélica (Lucas 7, 36-50; Mateus 9 10-13; 11 18-9; Lucas 4 17-21; 6 36-38; João 8 3-11). Deixarei aqi o texto de Lucas 6 36-38: “Sede misericordiosos como o vosso Pai é misericordioso. Não julgueis, para não serdes julgados; não condeneis, para não serdes condenados; perdoai, e vos será perdoado. Dai, e vos será dado; será derramado no vosso regaço uma boa medida, calcada, sacudida, transbordante, pois com a medida com que medirdes sereis medidos também”.
Segundo: esta proposta acaba com a lei punitiva; e é com o medo da lei em vigor, que julga e condena a mulher abortiva e, muitas vezes, sem dinheiro para recorrer a meios clandestinos ou estrangeiros, decide levar a gestação até à hora do parto e, então desfazer-se do filho não desejado, arrojando-o ao lixo, ao cano de esgoto, à cova do quintal, praticando um horroroso infanticídio. Estas são as duas razões substantivas da minha decisão.
Actualmente, sou um padre em situação de jubilação, desde 2003, nos termos do c. 538, § 3. Moro, em Cruzamento de Orgens, 3510-674, Viseu, em casa da minha irmã Maria do Socorro, senhora licenciada em Germânicas, durante muitos anos professora em Viseu, Abravezes e Grão Vasco, escritora, autora de “Quem matou o Professor”, inteligente e sensata, que constituo juiz dos meus passos, não preciso da dádiva do seu apoio, mas do conforto do seu convívio fraternal.
Em Maio de 1987, a requerimento meu e preenchidas as condições canónicas, o senhor D. António Rafael, então, Bispo Bragança e Miranda, concedeu-me a desincardinação da diocese de Bragança. Em Julho de 1988, a requerimento meu e preenchidas as condições canónicas, o senhor D. António Xavier Monteiro, Bispo de Lamego, concedeu-me a incardinação, nesta Dioeese . Exerci o ministério paroquial em Almofala, Salzedas, Cujo e Monteiras. Quando pedi o relevo da paroquialidade de Salzedas, D. António Xavier Monteiro, confortou-me com o título de “grande padre”, em carta de 5.7.1990.
Alguma observação me tem sido feita acerca do pouço que tenho escrito, que escutei com respeito e na dimensão devida. Na verdade, não confundo “doutrina da Igreja”, com aquilo que alguém possa pensar que é doutrina da Igreja. Nunca pretendi contrariar doutrina autêntica da Igreja, a que estou sempre atento e obsequente, o que me não inibe criticar, o que se pode criticar, sugerir o que se julga melhor, por força da liberdade dos filhos de Deus.
Em 1971, escrevi um livrinho onde defendo a tese do celibato opcional para os padres. Os Serviços de Censura pediram a Direcção Geral de Segurança para apreender o meu livro «O Casamento dos Padres», o que foi realizado. Em 30.5.71, requeri ao senhor Presidente do Conselho de Ministros, ao tempo Marcelo Caetano, a libertação do livro. Em 22 de Junho fui informado, pelos mesmos Serviços de Censura de que, por despacho superior e em virtude do meu requerimento… recorrendo da interdição do livro…Por esse facto deverão cessar todas as deligências… de apreensão… todos os exemplares entregues nos…locais onde a apreensão se tenha verificado. O livrito vendeu-se de repente.
Quem não esteve pelos ajustes foi o meu Bispo de Bragança, D. Manuel de Jesus Pereira que, aliado ao de Lisboa, suspendeu-me do exercício de Ordens. O trabalho em Santos-o-Velho foi pressão do Pároco, ao corrente de todo o processo “maluco”. Ao fim de dois anos o D. António Xavier Monteiro ordena ao Pároco para me dispensar. D. António que, depois, me incardinará em Lamego.
Já que tanto se tem diabolizado o meu comportamento, sem motivos sérios, é justo que eu traga ao público o que outros têm dito de mim. Fui tenente graduado capelão, na Guiné. 1966-1968. Na O. S. Nº 174, dizia-se: “Que louvo o Tenente Graduado Capelão… porque, para além da assistência religiosa prestada ao pessoal do Batalhão (de Cav. 1897) se dedicou com muito entusiasmo e dedicação à acção educativa, primeiro das crianças nativas em idade escolar e, posteriormente, criando um curso nocturno para nativos adultos que teve o melhor acolhimento por parte da população e que tem funcionado com pleno rendimento. De citar ainda toda a sua colaboração e melhor cooperação no funcionamento da Cantina da Unidade”. O Tem Cor, C. Chefe do Serviço, Padre Cachadinha ercrevia-me: “Ao tomar conhecimento do louvor que tão justamente acaba de lhe ser atribuído, apresso-me a felicitá-lo….” E o senhor Bispo, Capelão-Mor: “Chegando ao meu conhecimento a citação elogiosa que recentemente lhe foi atribuída pelo seu Comando, apresso-me a apresentar-lhe as minhas calorosas felicitações por este justo e público reconhecimento das suas qualidades de abnegação…” O Padre Bártolo, capitão capelão chefe, quando da sua despedida: “…um abraço de despedida e o meu reconhecimento muito penhorado pela tua leal e excelente colaboração. Apreciei imenso o teu trabalho, a tua dedicação, o teu carácter….”. No Relatório final do senhor Coronel Carlos Vasconcelos Porto, é-me dedicada mais de uma página, destacando a minha actividade no campo da instrução; o relacionamento ecuménico com os maometanos…
É este o padre diabólico que defende e perdoa os pecadores e os recém-nascidos.
Pe Manuel Augusto Costa Pinto